terça-feira, 9 de outubro de 2012

O luto é escuro

A luz não se apagou quando a energia cessou e houve um breve momento de resistência, como se algo fosse eterno, julgava-se eterna. Uma vida relutante sem querer que a escuridão tomasse conta; agonizando oscilante, um pisca-pisca, um fio incandescente amarelo-laranja. Não por muito tempo, embora parecesse interminável. E o bojo transparente que a envolvia e era seu escudo, sua cerca eletrificada e campo de força, assistia impassível a luta sabendo o final. Não interferiu porque não podia; por ser apenas seu hospedeiro, seu ambiente seguro e onde a recebeu sem ao menos conhecer.


Apagou de vez. O escuro mais escuro, tão negro e retinto que não se imagina, instaurou-se implacável. Inundou e transbordou por onde podia, infiltrando-se nas frestas e cantos, desaparecendo tudo. Nada existia mesmo existindo. Tudo estava lá e não estava. O chão, a parede e o teto eram a mesma coisa: uma massa uniforme de um negrume tosco de enjoar. O que parecia já não era, nem sombra da sombra. Que sombra? Não há sombra sem luz, nem reflexo, nem cor. Treva pura pairando sem a menor culpa.

O tempo fica mais mole, a temperatura começa a cair e o ar fica esquisito. A cegueira temporária ensina a tatear no escuro, a depender de outros sentidos. No começo se esbarra, bate, tropeça e cai. Machuca-se muito e a dependência desespera. Primeiro vem a luta, o inconformismo, a dor e raiva. Gritos internos, xingamentos insanos e culpa por tudo. Os questionamentos beiram a insanidade, invenções e ilusões que surgem do medo e abandono. Solidão negra de matar. O luto é escuro.

Aos poucos se acostuma com aquilo, tal nascesse assim. Resigna-se. Fazer o caminho várias vezes, memorizar os obstáculos e conviver sem luz parece ser o melhor a fazer. É isso que se faz por não ter nada mais a fazer. Não se pode determinar a duração desse estado e mesmo depois de acabar ainda ficará na memória; então não passará nunca, mesmo tendo desaparecido. O tempo passa indefectível.

Passa o tempo, passa bem. Hoje já se pode enxergar os contornos, os volumes e o negro deu lugar ao cinza. Vida em negro e cinza, nada de branco e cores. Não há mais o embate, a preocupação, o cuidado. O ambiente não assusta mais de tão normal ser anormal. Os olhos já não buscam o que não existe no imaginário e a conformação enche os pulmões, alimenta a fome e sacia a sede.

E quando se pensa, há um minuto de morrer, um estranho encarregado entra e troca a lâmpada. A luz cega também, o que era pouco se excede e cega. Nada se vê no branco brilhante iluminado claro. Mas agora se sabe da mortalidade da luz. Um dia vai escurecer novamente e a experiência das trevas passadas servirá.

Saudade, muita saudade da minha luz.

Simone, com orgulho, Giudice!